Está exactamente agora a fazer 20 anos, em que na Faculdade de Letras, querendo nós estudar o Palácio de Monserrate fomos empurrados, soi-disant, para a necessidade absoluta de investigarmos "As Origens do Gótico".
Alguns dirão – “um disparate !” [1], e em parte concorda-se com eles. Mas por outro lado, para a arquitecta ensinada no funcionalismo de meados do século XX, nada mais fascinante e depois muitíssimo enriquecedor.
É por isso que, algures no nosso estudo, hoje livro [2], se pode encontrar uma frase como a seguinte, que pode parecer totalmente deslocada quando se olha para o Palácio de Monserrate:
“Ao mais alto nível, a criação artística medieval serviu a Teologia. Arte e Teologia foram totalmente concordantes, num tempo em que a vida era principalmente dominada pela lógica religiosa.”
Mas repare-se – agora na citação seguinte - e como o estilo Gótico tinha ficado tão mal-visto no período Renascentista:
“...Gótico es el absurdo nombre que dio Giorgio Vasari (1511-1574), el gran historiador del arte italiano de s.XVI, al «oscuro» arte de la Edad Media, que vino a introducirse entre um glorioso passado, el arte de la Antigüedad clásica grecoromana, y su propria época, el Renacimento...” [3]
E sublinhou-se acima nome absurdo porque era à volta desse nome e dessa questão enigmática, que muitos andavam. Se esses outros fizeram o que fizemos, nunca o saberemos? Mas a nós pareceu-nos que seria bastante lógico ir à procura daquilo que tinha sido mais característico na história dos povos Godos.
Foi quando percebemos que tinha existido o arianismo (e até o semiarianismo ! [4]). Foi quando percebemos como certos Diagramas (e depois evoluímos para a palavra Ideograma [5]- preferindo esta última designação) actuaram como se fossem palavras que carregavam de sentido uma qualquer obra.
Fazendo nas artes visuais, o que fazem as palavras e as designações na literatura.
Foi também quando detectámos a existência de dois textos fantásticos - que são entradas na Enciclopédia Verbo. Uma delas sobre o Arianismo [6], e a outra relativa ao Filioque [7].
E numa dessas entradas, na última, sobre o Filioque, e a procedência do Espírito Santo - para os cristãos orientais vindo do Pai; e do Pai e do Filho em simultâneo, para os cristãos latinos - consta qualquer coisa de muito surpreendente, que nos deixou emudecidos:
"Ambas eram perfeitamente ortodoxas, se bem que a 1ª exprimisse um conceito mais dinâmico da vida trinitária, ao contrário da lat., de configuração mais estática."
Perante isto, e como sempre nos acontece quando se tem dificuldade em compreender, passámos ao desenho e à esquematização das ideias contidas no que se estava a ler.
Os desenhos seguintes, agora já não os das margens dos livros e dos apontamentos como fomos desenhando - visto que foram passados a limpo - traduzem essas duas concepções, que se opuseram. Desde antes do Iº Concílio Ecuménico - Niceia 325 (d. C). Concílio convocado pelo imperador Constantino («nada satisfeito» com a existência de um tema tão pequenino, e sobretudo tão abstracto, mas que levava os cristãos a digladiarem-se):
1. A ideia inicial dos Godos, que ficou na história e na teologia conhecida como Per filium. A tal que traduziria uma "vida trinitária mais dinâmica".
2. A ideia a que os Godos, seguindo os Francos de Clóvis, se vieram a converter - o Filioque - passando depois eles a proclamar (quase mais do que todos..., e depois no séc. IX, com Carlos Magno) a igualdade do Pai e do Filho. Ou seja, defendendo o que é visto como "um conceito de vida trinitária mais estática".
[1] Caso de Vítor Serrão que quando se apercebeu do que estava feito (em 2005 e para não fazer péssima figura), já só teve tempo de nos impedir, no fim desse ano, que ingressasse para o doutoramento, na Faculdade de Letras. Onde, o que tinha feito desde 2002 me deixou feliz, e absolutamente convicta, como continuo, de toda a correcção, e do valor, do trabalho. Mais, a Vítor Serrão aconselha-se que leia, por exemplo este texto. E ainda, Notes On the Synthesis of Form, no caso de estar interessado em ser minimamente informado sobre, como foi o ensino dos arquitectos seus contemporâneos.
Concretamente como aprenderam a pensar com esquemas, bastante semelhantes aos que estiveram na origem dos estilos históricos da arquitectura.
Será mais útil do que expulsar alunos
[2] Nesta altura até sei que está em saldos, quase a 1/3 do preço que teve em Junho de 2008, data da publicação. Ver em Livros Horizonte
[3] Ver Ursula HATJE, Historia de los Estilos Artísticos, desde la Antiguedad hasta el Gótico, Madrid 1975, p. 8..
[4] Como também consta num Dicionário de Oxford... Não é uma invenção da Enciclopédia Verbo Luso-Brasileira de Cultura, para um fenómeno que tocou particularmente a Pens. Ibérica como A. Quadros e (antes dele) Pinharanda Gomes mostraram.
[5] E os Diagramas ou Ideogramas (como preferirem!) nas obras de Arquitectura, são como que partículas menores. Mínimas, mas significativas (e falantes). São detalhes que quase nem vemos, mas que em geral integram cada estilo. E se há nos estilos um Zeitgeist (?), e há sem dúvida, esse espírito que (visualmente, está nas obras) mais caracteriza cada época, resulta do maior ou do menor emprego – da maior ou menor presença – de cada um dos referidos diagramas, em cada uma das obras que se podem analisar.
[6] Ver na Enciclopédia Verbo Luso-Brasileira de Cultura, no volume 2, cc. 1102-1104.
[7] Idem, ver no volume 8, cc. 837-838.