Já citámos (talvez mais do que uma vez?) esta frase de Copérnico, na carta que dirigiu ao Papa Paulo III:
“…nevertheless I knew that others before me had been granted the freedom to imagine any circles whatever for the purpose of explaining the heavenly phenomena…”
Ora os “any circles” a que se refere seriam as órbitas dos planetas como consta no trabalho que escreveu De revolutionibus orbium coelestium* feito – como é sabido - para demonstrar que era o Sol e não a Terra que estava no Centro do Universo.
Depois, acrescenta “whatever for the purpose”, que traduzimos como: para qualquer que fosse o propósito; e por fim – “explaining the heavenly phenomena.” E esses fenómenos dos Céus a que Copérnico se refere, de acordo com uma mentalidade antiga, e depois medieval (o que se pode ver na Hierarquia Celeste do designado Pseudo Dionísio, o Areopagita), era Deus, ou o Divino, como alguns diziam.
Acontece que este extracto de Copérnico nos serve para introduzir o que, mais uma vez se explica sobre a representação de Deus – que é a Trindade (Cristã) - com recurso a círculos.
Mas aqui, desta vez vamos preceder a nossa explicação de uma analogia, como é aliás muitíssimo comum fazer quando se pretende ensinar.
Servimo-nos «da estrutura»** de vários esquemas apresentados há dias no jornal Expresso (4.02.2017), feitos para sintetizar o que pode vir a ser a evolução da solução governativa actualmente vigente em Portugal.
Estes esquemas (visuais) feitos à base de círculos, partiram da consideração da existência de 3 entidades, as quais são mais distintas (ou independentes e separáveis) dentro da Assembleia da República, do que no Governo. Já que aí se fundem nos seus propósitos (para darem todo o apoio às soluções governativas). Como sabemos as referidas entidades são os partidos políticos (que foram representados, ou substituídos por círculos):
- Partido Socialista (PS) – círculo maior
- Partido Comunista (PCP) - círculo menor
- Bloco de Esquerda (BE) - círculo menor
Segundo os «prognósticos» do Expresso, as tais 3 entidades (acima), de acordo com os seus verdadeiros interesses, no futuro podem vir a conseguir equilibrarem-se, ou a desentenderem-se, segundo 4 maneiras diferentes:
1ª - “Esquerda (que são os 3 partidos) estica mas não parte… “. É a ideia contida no esquema seguinte:
2ª “O Diabo mata a geringonça”, e continuam a ser palavras do jornal Expresso (ideia que se traduz nos círculos separados…):
Na 3ª hipótese: “Costa para Marcelo estou bloqueado” – e idem, continuamos a citar o Expresso do dia 4 de Fev. de 2017, e a repetir os esquemas aí usados:
Por fim, na 4ª hipótese: “Um parceiro descola num OE”. Idem aspas, é uma opção do autor do artigo, que o ilustrador ao serviço do jornal entendeu representar na versão visual seguinte:
Ora tudo isto estava na página 10, como já se disse, do jornal Expresso do passado dia 4 de Fevereiro. Há 2/3 semanas!
Poderíamos começar por perguntar se os reitores, os presidentes ou os directores de alguma escola de design terão visto estes esquemas?
E se os viram, se repararam na respectiva expressividade?
E ainda, se terão eventualmente reparado que se tratam de círculos a colaborar numa mais clara transmissão de ideias? [Como fazem os caracteres alfabéticos, da escrita, que lemos e ouvimos, num processo que é primeiro fonético, e só depois se transforma em ideias].
Ou será que os reitores, presidentes e directores dessas escolas, criticaram a escolha dessa forma (os círculos das «órbitas ptolemaicas»), e em alternativa terão achado que uns quadrados, elipses, ou triângulos seriam bem mais convenientes *** e adequados, para transmitir as ditas ideias? Já que os governos são ou podem ser quadrados; os governantes também, pois sentam-se em cadeiras rectangulares e trapezoidais. Vêem ecrãs quadrados e rectangulares, e como todos escrevem em folhas A4. Estão ainda em gabinetes rectangulares, ou, no suposto semicírculo (e este será rigoroso?) que é a Sala da Assembleia da República em S. Bento.
Deixando a ironia avança-se na analogia.
Pode parecer demasiado prosaica, mas na verdade para explicar «as coisas do Céu», e de Deus, foram sempre muitas as metáforas e as analogias (como por exemplo até as asas e as nuvens, eram usadas antes dos círculos).
Em geral, na Arte chamam-lhes alusões, alegorias, símbolos, imagens, etc., etc. Que substituem, ou se correspondem, nem sempre univocamente (como a matemática e a filosofia ensinam o que isso é), a outras realidades que se querem designar. Pior, a Arte está repleta de Polissemias, que muitas vezes dificultam o seu entendimento, e levaram até, a que muitos estudiosos e investigadores achem que se tratam de segredos! Mas esse seria um tema quase infindável (pano para mangas, e muitas outras ocasiões)...
Assim, e para encurtar, que nos lembremos, de todas as metáforas a mais poderosa, talvez também a mais «realista»?, para explicar e dar a conhecer Deus - e portanto a que nunca foi ainda abandonada - tem sido a LUZ. Tornada imagem de Deus, e muitas vezes ainda agora associada ao BIG-BANG que se admite, e questiona, se esteve na origem do Universo?
Alguns sabem que a Luz se refere no Credo (cristão), que é Símbolo (e proclamação) da Fé, nestes termos: “… Deus de Deus, Luz de Luz, Deus verdadeiro, de Deus verdadeiro… etc.”
Assim, partindo agora destes (já longos) pressupostos - que para cada um de nós são tão simples e inatos, sempre que desenhamos esquemas, com figuras para dar explicações; mas que, apesar desse nível geralmente inconsciente, note-se que quando abordados directa, e especulativamente, eles se tornam muitíssimo complexos.
Assim, partindo das bases acima enunciadas, e tendo alguns conhecimentos da História da Igreja: primeiro da Igreja fundada pelos Apóstolos (de Cristo), e depois das várias outras que por cisões veio a originar. Sabendo inclusivamente das muitas ideias diferentes (algumas consideradas heresias), surgidas em torno da Trindade; ou, como dizemos, até da sua organicidade interna, que alguns chamam Pericorese, e a que S. Tomás chamou Circuminsessão (em inglês circumincession ou circuminsession). Estando nós mais ou menos alertados para esta temática (amplíssima), no nosso caso aconteceu-nos, a partir de 2002 (e dos estudos de um mestrado dedicado ao palácio de Monserrate), apercebermo-nos da imensa importância do Pensamento Visual (e da Geometria - que é a sua base) para a formulação de toda uma série de ideias sobre Deus e a Trindade. Enfim, para explicitar o Deus Uno e Trino do Cristianismo.
E do ponto de vista das necessárias provas (históricas) de que isto aconteceu, para nós, uma dessas melhores provas - ou a evidência deste modo de pensar (já chamado Visual Thinking, por Rudolph Arnheim); claro que agora já não é o jornal Expresso de há 15 dias, mas sim os Círculos Trinitários - que Joaquín de Fiore chamou Figurae, e os incluiu no seu trabalho que designou Liber Figurarum.
Esse Cisterciense da Calábria, que hoje a Igreja venera como Beato, teve, no entanto, vários seguidores, que ao longo dos tempos têm sido considerados bem menos heterodoxos. É que eles acrescentaram muita confusão, num tema que além de abstracto é passível das mais variadas interpretações. E a Igreja de hoje, talvez mais ecuménica e muito menos dogmática (?), pode chamar-lhes exegeses, sentindo-se enriquecida por essas leituras e interpretações diferentes...
Como já se apresentou (noutros posts), o dito abade cisterciense serviu-se de uma figura que terá elaborado cuidadosamente (a ver aqui) – onde é nítida a preocupação de fazer entrelaçados entre os (3) diferentes círculos, para conseguir traduzir a unidade e a comunidade, entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Embora ainda, e como mostra essa figura, com alguma margem de distinção (entre cada uma das pessoas trinitárias).
Assim, continuamos – e continuaremos a afirmar (e a fazer todos os possíveis) – para que se perceba que foi destes esquemas que nasceram muitas (ou talvez a maioria?) das formas abstractas da arquitectura antiga e tradicional. Desde a forma das plantas das edificações – i. e., o desenho da implantação de muitos edifícios, sobretudo o das igrejas, mas também alguns detalhes dos alçados e dos ornamentos.
E se isto – todo este tema que é absolutamente apaixonante, relativo à comunicação visual e à sua passagem à tridimensionalidade (na arquitectura) - não interessa à que se auto-afirma como a melhor Escola de Design em Portugal. E se nem interessa, também, ao Departamento de História da Arte da Faculdade de Letras de Lisboa. Se, definitivamente, estas instituições a que estamos vinculados (também a FBAUL), se elas continuam na sua teimosia ignorante, então, sobre Ciência, qualidade da investigação e Progresso Científico, estamos todos conversados:
É esta a nossa maior pobreza …
E atenção que não se está aqui a discutir a existência de Deus, já que isso é do foro de cada um, e do que lhe foi revelado (Tomás de Aquino). O que temos vindo a tratar é de HISTÓRIA:
A do pensamento e das ideias dos homens. As que os humanos reverteram para imagens que se podem ver, quer «ao virar da esquina» (como Thanks God fez o jornal Expresso, facilitando-nos a vida), quer em manuscritos antigos: que quando se procuram eles logo aparecem.
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*Traduzido para inglês como On the Revolutions of the Heavenly Spheres, o que se pode ler aqui
**Dizemos estrutura porque os desenhos que se apresentam agora são nossos: usando as mesmas imagens com meios mais simples e menos tempo.
***Conveniente (no sentido de decoro, decoroso) como Vitrúvio escreveu e M. Justino Maciel explica (a todos os quiserem compreender!).
O post de hoje completa os anteriores que, tristemente, estavam sem imagens. De futuro (logo que possível) vamos recolher plantas de igrejas que nascem de círculos e alçados com rosáceas, janelas, guardas, grades, torres sineiras, que prolongam ad aeternum, sempre, essa mesma escrita, feita com os mesmos vocábulos e as suas «reuniões» que tiveram significados mais específicos!