... e o Culto (e vice versa [1])
Era diferente/foi diferente teologicamente, Maria ser a Mãe de Cristo ou ser a Mãe de Deus.
Questão que originou enormes discussões e querelas, porque um ou outro conceito, se relacionava diferentemente, com ... - e portanto dando sentidos diferentes - à «natureza» de Cristo [2].
No Oriente usou-se a designação Théotokos, que está (quase) directamente ligada ao dia de hoje, e à proclamação da Imaculada Conceição.
Sintetizada, sem dúvida, e de maneira magnífica, na última imagem, proveniente de um, ou dos vários posts, que sobre o assunto (com destaque para este), já se publicaram há alguns anos.
Embora como se pode ver, há outros posts em Primaluce, e em Iconoteologia [3]).
No entanto, que me lembre, nunca se escreveu sobre a cena da imagem seguinte, a qual foi muitíssimo representada. E que, sobretudo, ficava directamente implicada, no que deveria ter sido (se se tivesse concretizado), o nosso doutoramento [4]...
É uma imagem de enorme beleza, vinda daqui, e na qual a Mãe de Cristo está representada com os 12 apóstolos, companheiros de Jesus.
Encontravam-se juntos em Jerusalém, vindos do monte das Oliveiras, "... subiram à sala superior, ...", e, mais tarde "Tendo-se completado o dia do Pentecostes,..." [5]
Ora isto vem ainda a propósito da imagem acima, que descreve visualmente a descida do Espírito Santo. Imagem que, para nós, é forçoso associar ao que está no tecto do Mausoléu de Galla Placídia (em Ravenna):
I. e., na fotografia que neste momento é também um pouco «nossa», por estar na nossa página de Facebook.
Só que, e apesar de as termos escolhido, note-se que não consideramos essas imagens, particularmente bonitas. Mas a Arte - ao contrário do que em geral se pensa - também não tem forçosamente a ver com o «bonito»... Estando em geral os seus patronos, e os artistas executantes, muito mais preocupados com o falante, e com a respectiva capacidade de expressão das ideias.
Se há bonito (?), pergunta-se, o mesmo estará mais relacionado não tanto com a afectividade, ou a emoção que passa, contida e legível nas composições visuais; mas com uma simpatia (ou empatia), pela qual o nosso relacionamento - o de cada um - vai acontecendo, face à obra que admira, ou contempla.
Principalmente porque essa admiração corresponderá, em grande parte, ao reconhecimento da habilidade, e, ou à técnica do autor. Um autor que por isso passamos a dizer que foi habilidoso, reconhecendo nele as qualidades do artista.
Ou seja, reconhecemos que se conseguiu aliar às imagens da obra visual, as palavras, os relatos, e as ideias, que estão contidas nas cenas bíblicas. Neste caso no Novo Testamento, concretamente nos Actos dos Apóstolos, onde se relata o Pentecostes.
No entanto, no referido relato a presença do Espírito Santo aparece como algo surpreendente: como um "...vendaval impetuoso..." , acompanhado de "... línguas como de fogo, que se repartiam e que pousaram sobre cada um deles." O que aliás está na imagem (mas não com o ímpeto da descrição literária, e de uma forma muito mais estática).
Mas também nessa descrição (literária) não se lê que estivesse a Pomba : a imagem (símbolo) que tinha ficado associada ao baptismo de Cristo no Jordão... ?
E perante esta «desconformidade» estranha-se ...
Só que - e tal como André Grabar escreveu [6] - nem sempre as representações do Espírito Santo, em sua opinião, estiveram ao alcance dos artistas (imagiers) e criadores das obras:
« Mais ce qui advint de l’unique schéma iconographique alors utilisé (la colombe) est aussi curieux : Cette allégorie provient bien sûr du texte évangélique qui décrit le baptême du Christ ; il faut cependant reconnaître qu’elle est archaïque, surtout si on la compare aux autres images théologiques, et qu’elle est plus proche des tout premiers symboles chrétiens, comme l’ancre et l’agneau. Ces allégories anciennes se trouvèrent en général remplacées par des figures humaines à partir du quatrième siècle ; mais la colombe du Saint-Esprit resta, et sert encore aujourd’hui à désigner la troisième personne de la Trinité »
Assim, em boa verdade, e voltando à imagem que está no tecto de Ravenna, o que para a maioria pode parecer uma Concha, em nossa opinião é/foi, intencionalmente (defendemos esta ideia), uma estilização da Pomba.
A composição foi desenhada de tal modo que, perante a ambiguidade e a dúvida, se viessem a ler - ou que ocorressem (na mente) - duas ideias, quase simultâneas. E as duas relativas ao Baptismo:
A Concha e a Pomba
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Quanto à imagem seguinte, segundo se crê (e lê, visto que o texto escrito pretende reforçar a narrativa visual) ela corresponde muito mais (do que a anterior) ao que se celebra hoje. Porque, lentamente, durante (13-14) séculos, se veio a reforçar e a defender a ideia da presença de Maria na Igreja
[1] Este título, porque se tem a noção que a nossa Cultura – aqui na designação abrangente, i. e., tomada em sentido lato – é, verdadeiramente inseparável do culto cristão.
[2] Divina ou Humana. Questão que esteve também na origem de algumas heresias...
[3] Como se pode ler indo por aqui e aqui, respectivamente.
[4] Intitulado Sinais do Espírito Santo na Arquitectura Posterior ao Cisma de 1054, e suas Sobrevivências. O tema aprovado pelo Conselho Científico da FBAUL em reunião realizada a 28 de Abril de 2006 (conforme documento comprovativo e datado de 8.05.2006).
[5] E na qual tem origem não apenas o Pentecostes Cristão, mas também - e principalmente pela importância deste facto - a Igreja, como Assembleia dos crentes
[6] Ver em André GRABAR, Les Voies de La Création en Iconographie Chrétienne, Flammarion, Paris 1979, pp.111-2.
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