Muitas imagens da arquitectura foram «iconoteologia». Many images of ancient and traditional architecture were «iconotheological». This blog is to explain its origin.
27.11.20

Desde que conheci esta imagem fiquei fascinada com ela.

E emocionada, e sei lá até se com o coração a bater acelerado...? Foi amor à primeira vista.

P1010026-A.jpg

Mas depois li, e reli, a legenda dos editores, e de quem seleccionou as imagens deste livro que é absolutamente maravilhoso*.

Li avidamente à procura de mais. Mas a legenda (abaixo), embora com algumas "tournures" - que pretendem alertar para algo que a composição possa conter; apesar disso, o que deixaram escrito pouco adianta, ficando muito aquém - completamente «abaixo» - da imensa riqueza (conceptual) da obra que, há séculos tinha sido criada...  

P1010026-B.jpg

É que na imagem o que se vê, tirando os dois jardineiros, e os pauzinhos mais ou menos retorcidos e naturalistas, de uma trepadeira que provavelmente devemos pensar como sendo uma  vinha; o que todos vemos - canteiros, escadas, paliçada, casa - com porta e duas janelas; e ainda os arcos (de círculo) entrelaçados - tudo isso, todo o cenário é, propositadamente e assumido, feito exclusivamente de Geometria**.

É aliás um óptimo exemplo, dos melhores que conhecemos, para associar àquela frase original (em grego) do Pseudo-Dionísio, o Areopagita;  à frase que Maurice de Gandillac traduziu para francês assim:

"...En somme une intelligence perspicace ne saurait être embarrassé pour faire correspondre les signes visibles aux réalités invisibles.” **

Mas, e para o caso de haver dúvidas sobre a legibilidade desta, e de outras obras, para isso estamos aqui.

E vamos continuar a estar, mesmo que, como hoje, fique para o leitor a tarefa principal que é a de fazer a leitura/interpretação da obra. Que responda a esta pergunta:

Porque é que alguém diz que a imagem acima é linda...? 

~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~

Referimo-nos a Le Moyen Âge en Lumière, dir. Jacques DALARUN, Fayard, Paris 2002.

** A mesma (geometria) que para Hugues de Saint-Victor era - "...source des sensations et l'origine des expressions".

*** E que várias vezes já citámos noutros posts. Como por exemplo neste outro.

link do postPor primaluce, às 14:30  comentar

20.11.20

Por aqui continuamos a reunir imagens de círculos entrelaçados, que, como é sabido podem ser «arrumados» de muitas maneiras. Isto é, de acordo com diferentes regras geométricas: abaixo de acordo com uma malha triangular, ou, que também poderíamos dizer: ad triangulum.

fromGombrich-p.68-b.jpg

Mais, sabemos como muitas imagens anteriores ao cristianismo, por diferentes razões - da ordem dos sincretismos, e de acumulações, que sempre se observam nas obras de arte; em resumo, e para abreviar caminho, sabemos que um dia muitas dessas imagens, que já existiam,  porventura com algum valor significante, tornaram-se como que verdadeiros emblemas: neste caso da religião cristã.

Porém, ultimamente, quem acompanha os nossos posts, pode constatar que temos estado mais dedicados aos quadrifólios. Imagens que obedecem a uma malha quadrangular, e que se quisermos também podemos designar ad quadratum (como acima se referiu a designação ad triangulum).

E aqui, há que o dizer, desde há anos, quando entrámos nestes temas, passámos a considerar a colocação do quadrifólio,  numa qualquer obra - como ornamento, como alegoria, como símbolo, ou enfim como mnemónica - que pretendia aludir à Virgem, Mãe de Deus. Designada Theótokos

theotokos-C.jpg

Já escrevemos alguns posts sobre o assunto, como é o caso deste...   Ou ainda deste outro.

Escritos que, muito provavelmente, não serão os últimos dedicados a este tema*. Tanto mais, que é insistente e sempre muito repetida, a inclusão destes Ideogramas nas obras de arte. Desde a antiguidade tardia (como na 1ª imagem seguinte) à arte contemporânea de uma casula desenhada por Matisse. Na 2ª imagem, como a vimos e como a lemos**.

*David Gategno em b.a. - ba Símbolos, Hugin 2000, ver p. 102, escreveu sobre o quadrado: "...simboliza a Terra-Mãe como mediadora divina entre a sua progenitura humana e o amor principial de Deus". E no Dicionário dos Símbolos por Jean Chevalier e Alain Gheerbrant, ed. Teorema, p. 556, sobre o Quatro, e depois de inúmeras associações e significados, quase no fim (e segundo as teorias de Jung) pode-se ler: "a Virgem Maria, em quem o amor (o Eros) atinge a altitude da devoção espiritual;"    - 

**E naturalmente, neste exemplo de Matisse onde a cruz aparece sobreposta a dois trifoils, é para nós demasiado evidente, que os quadrifoils não foram escolhidos e colocados gratuitamente: como uma imagem que se aplicasse apenas porque sim e apeteceu! Um qual mero voluntarismo que apeteceu ao autor, simplesmente por gostar da forma... 

Nada disso, como é óbvio, os quadrifólios foram usados pelo seu significado antiquíssimo.

link do postPor primaluce, às 13:00  comentar

15.11.20

Vem na sequência dos posts anteriores, até porque isto da Geometria*, se para alguns foi linguagem, para nós é imensa curiosidade: ou seja, uma espécie de vício permanente**.

QuadrifolioVãos-Pal.DuquesDeBragança-pergunta.jp

A janela é a do Palácio dos Duques de Bragança, na Vítor Cordon, rua que se chegou a chamar do Ferragial de Cima.  

No Espaços & Casas, Eps nº 44 - Programa 603 - fiquei (quase) fascinada com o exemplo de restauro/reabilitação que foi feita

Como dizem "foram preservados detalhes arquitectónicos da sua traça original, as fachadas foram mantidas..."

~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~

*Geometria da qual Hugo de S. Victor, em Didascalicon, disse ser: "...source des sensations et l'origine des expressions".

** Na verdade, ao aperceber-me como os teólogos se socorreram da Geometria, para explicarem (e defenderem) as suas subtilezas, desde então, ver e descobrir (com todo o cuidado) nos desenhos rigorosos, o que é que de facto lá está, passou a ser um objectivo. Daí dizermos que se trata de um vicio (da curiosidade) 

link do postPor primaluce, às 18:00  comentar

13.11.20

Como se vê pelas imagens, e considerando a nossa metodologia, de que se escreveu no post anterior, temos mais alguns desenhos a fazer:

E desse modo apreender a lógica da construção gráfica (no contexto do que foi uma iconoteologia) que está subjacente à forma/design que foi dado às janelas do Palácio dos Duques de Bragança, em Lisboa, no Chiado.

fromBehance-E.jpg

Como está no título, e se provou ao estudar Monserrate*, da Teologia à Arquitectura não foi um passinho, simples e curto. Mas sim foi uma passagem, que aliás já tinha raízes na antiguidade, como A. W. N. Pugin e George Hersey  escreveram e lembram... 

fromBehance-F.jpg

Em suma, há que registar que apesar da Ciência** querer distância relativamente a algumas das questões que vimos a colocar - e que se julgam absolutamente pertinentes para o restauro dos edifícios antigos: o que também passou a ser designado regeneração da cidade).

No entanto, o cuidado posto no seu trabalho por alguns profissionais, como este caso é um exemplo razoável***, isso também revela que a cultura, e as formas tradicionais - o que em tempos chegou a ser visto como picturesque - é uma mais valia que pode «ajudar ao negócio».

Provando assim, naturalmente, que apesar de a Ciência ser pouca - não difundida, maltratada - há quem queira superar as limitações existentes, fazendo o seu melhor:  i. e., mesmo que as bases teóricas ainda sejam rudimentares

duques_de_braganca_092-300.jpg

As fotografias acima - óptimas para o nosso propósito tão especifico (comparar regras de «desenho projectual», como se vê na imagem seguinte) - vieram de: 

https://www.behance.net/gallery/44273239/Duques-de-Braganca-Lisbon

comparar-osDoisVãos.jpg

É que, aqui para nós que somos arquitectos - e não para os historiadores de arte, cuja forma de pensar é outra, totalmente diferente...

Para nós a construçao das imagens a plasmar nas edificações implica toda uma grande série de tarefas, que é totalmente independente dos trabalhos de construção: i. e.,  da obra que é posterior às decisões projectuais.

A concluir: se a arquitectura é "cosa mentale", já a construção é, completa e exclusivamente, uma coisa mecânica 

~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~

*Ver em Glória Azevedo Coutinho, Monserrate uma Nova História, Livros Horizonte, Lisboa 2008.

**Neste caso a História da Arquitectura

***Porque há práticas habituais, e sobretudo há profissionais nas CMs que vão acompanhando os processos, tendo em vista a sua aprovação para construção. No entanto não há manuais/documentos escritos que clarifiquem e levem mais longe, exactamente ao nível da iconografia da arquitectura, como se deve proceder. E especificamente nesta zona de Lisboa, que é marcadamente georgian, corrente estilística que entre nós é pouco conhecida. É a zona que foi chamada bairro de S. Francisco, assente sobre o monte Fragoso e onde depois do terramoto "se levantaram numerosos palácios" . Edifícios que seguindo a nomenclatura de Robert Adam em The Globalisation of Modern Architecture provêm de "Faith-Based Styles".  

link do postPor primaluce, às 00:00  comentar

9.11.20

Não era suposto fazer este desenho. 

Mas ainda bem que o fizemos, porque ... as usually 

janelaGóticaChiado-castanho.bic-D.jpg

Ele trouxe-nos novidades, ou se aprendeu mais qualquer coisinha: sobre as imagens da arte, e neste caso sobre as formas da arquitectura. E isto apesar de alguns erros.

Pois não é apenas pelo erro mais nítido que o desenho tem (esse relaciona-se com os nossos nistagmas*); mas, para quem sabe geometria, pelos outros erros aparentes - que até não são bem erros -, mas mais a constatação da existência de várias «decisões conceptuais». O que se detecta que aconteceu neste caso, quando o nosso objectivo é copiar, ou recriar aqui, a imagem de uma janela que sabemos existir na zona do Chiado (concretamente no que foi o Palácio dos Duques de Bragança).

 

Em conclusão, o que acima estamos a chamar erros, não são distorções do olhar de quem fez o desenho, mas sim distorções ou desvios propositados, e que por isso podemos chamar-lhes, globalmente, uma intenção conceptual. Seriam, caso fossem erros, muito menos fáceis de se detectar ou perceber.

Porque o modelo real, e aqui nesta situação foi mesmo real..., mostra-nos que foram usados truques no desenho da janela- Talvez para a adoçar?

 

Perguntamos, pois seria, se fosse correcto, o tal "pointed arch",  que foi visto como inconveniente, pelos classicistas românticos**. Os que acusavam o Gótico de ter formas bárbaras: concretamente, demasiado pontiagudas

janelaGóticaChiado-0.jpg

E ao tentarmos desenhar a partir de uma fotografia com perspectiva, como sempre sabemos que vale a pena fazer contas, para encontrar, não a medida certa, mas a proporção. Duas coisas que são diferentes, e que muitas vezes são esquecidas... 

janelaGóticaChiado-1A (1).jpgjanelaGóticaChiado-1B (1).jpg

janelaGóticaChiado-castanho(1).jpg

Assim, e de acordo com esta nossa metodologia experimental, tendo sempre em consideração por um lado: 

 

1. o rigor da geometria - que devia funcionar como a gramática e a lógica que gerava as formas;  e ainda

 

2. os significados (por vezes também rigorosos, ou unívocos***, que eram associados a essas mesmas formas;

 

Deste modo, e tendo presentes esses dois considerandos, naturalmente só pelo desenho se podem compreender os objectivos dos criadores, que lidavam (ou projectaram) com imagens de génese medieval.

 

Se num dos nossos últimos posts escrevemos isto, chamando a atenção para o facto de as imagens anicónicas, serem vistas como simplesmente geométricas, e portanto insignificantes; na verdade também sabemos de quem tenha associado Amor e Geometria.

 

Porquê? Por uma simples razão: porque a Geometria pode falar!

 

E falou, falou mesmo muito alto, como também James Ackerman estudou esta questão a propósito da Catedral de Milão. Ao registar (segundo pensamos ele não compreendeu completamente) o que poderia ser uma obra Ad triangulum ou Ad quadratum. 

Acontece que na janela (acima), pelo menos intencional, na visão que cada um captava - e na luz que por dentro se obtinha - essas duas «regras» ou «estruturas essenciais do universo», o Ad triangulum e o Ad quadratum, estiveram presentes:

Legíveis como alegorias (alusões ou mnemónicas) que, para quem sabia dessa questão, dessa maneira eram lembradas

~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~

* Nistagmas são movimentos involuntários dos olhos, geralmente associados a vertigens

 

** Em inglês, não esquecendo que para Monserrate Uma Nova História muitas das nossas investigações foram feitas sobre bibliografia inglesa - onde várias vezes se aborda esta problemática. Não esquecer também que muitos românticos  (talvez ainda mais românticos do que os classicistas) viviam apaixonados pelo Gótico, sendo verdadeiros medievalistas

 

*** Univocidade, note-se, que aqui queremos dizer como sendo o contrário de polissémico: o que embora possa ter um sentido lato, que não é ambíguo.

link do postPor primaluce, às 11:00  comentar

 
Primaluce: Uma Nova História da Arquitectura
Novembro 2020
D
S
T
Q
Q
S
S

1
2
3
4
5
6
7

8
9
10
11
12
14

16
17
18
19
21

22
23
24
25
26
28

29
30


tags

todas as tags

subscrever feeds
blogs SAPO