... num doutoramento, relativo ao emprego de vocabulário visual (abstracto) de origem geométrica, nas obras do culto e da liturgia - ou da Arte Religiosa, Cristã.
Esse alguém teria de ter, com certeza! - para no final poder deduzir conclusões relativas à investigação e ao trabalho feito -, um enorme manancial de imagens.
É o que se passa com a imagem seguinte (uma dessas muitas): a fotografia de uma patena francesa do século VI, onde, no centro da cruz foram dispostos vários "8" deitados, ou ao alto, significando o Infinito-Deus.
Há portanto nesta imagem* - ou é assim que a interpretamos - várias leituras simultâneas, como se fossem em camadas, i. e., "...des couches de signification ou des détails d'aspect sensible..." como escreveu Jean-Paul Sartre em L'imagination**.
E vêmo-las:
A do belo efeito visual, sem mais; certamente o fascínio pelo brilho do ouro. Os corações, nos 4 cantos que um dia merecem outra explicação. E todo o trabalho ornamental, na bordadura, em que a imperfeição da obra artesanal, nos remete para o esforço de perfeição, que sempre houve, no que foi uma imensa vontade de criar beleza: Alguns autores referem "a volição artística" . A que Aloïs Riegl estudou meticulosamente (em El Arte Industrial Tardorromano, edição Visor, Madrid, 1992), e que Siegfried Giedion, e também Otto Pächt sublinharam.
Claro que a cruz onde se dispõem oito "8" é o centro da composição, e também nela se fazem várias leituras. Não é uma cruz grega (de 4 braços iguais), e por isso é dita cruz latina.
E por outro lado, não sendo uma cruz pátea - ver o que é nos dicionários de símbolos, mas ver também o que esses não dizem, que é o modo como a cruz pátea se associa formalmente ao que os franceses chamam, e vêem, como culots (cistercienses).
Mas assim, e embora não exista um alargar significativo dos braços da cruz, como é tipico da cruz pátea, a cruz desta patena, consegue ser um compromisso visual. Pois lembra algo que não estando, totalmente na imagem, está em parte.
Ou seja, alguns, os que estão alertados para os significados teológicos mais especificos de algumas das formas (e suas correspondências, que não eram codificadas mas hoje é como se o fossem...); esses mais habilitados, farão, como supomos leituras mais completas e ricas.
Por nós consideramos esta patena absolutamente fascinante (pelo que sintetiza e reúne), e ainda não nos esquecemos que seria um dos óptimos e claríssimos exemplos, do emprego do "8" como imagem de Deus.
Associada a ela vêm outras questões: que nos lembram toda a formação que os ourives tinham de ter para produzirem obras essenciais ao Culto e à Liturgia.
E vem no fim, para acabar este post, a ideia tão simples - mas que para muitos é ainda estranhíssima (embora possa ter toda a lógica!?) - de D. João V ter ido buscar o alemão Johann Friedrich Ludwig. O que ficou depois conhecido, em italiano, como João Frederico Ludovice: um Ourives para projectar a Basilica de Mafra.
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*Ver em 20 Siècles en Cathédrales, Éditions du patrimoine, Paris 2001.
**Edição QUADRIGE-PUF, Paris 2003, p. 88.