A Quilha da Arca de Noé
Assunto que há uns bons anos afligiu, muito, uma orientadora, pois não queria que na nossa tese houvesse algum equívoco relativamente ao que ela já tinha escrito, sobre o que lhe pareceria uma tonteria*, dos viajantes ingleses (?), nas suas demandas, no século XVIII, "Em torno das origens do Gótico".
Assim, e como Maria João Baptista Neto aprecia especialmente a língua inglesa, aqui lhe deixamos um excerto (da autoria de Grover Zinn) sobre a referida, e tão enigmática, "Keel".
"The keel of the ark is prominently indicated by a line running from the bow to the stern. Along this line Hugh inscribes the human genealogy of Christ, beginning with Adam, and the spiritual filiation of the Bishops of Rome, beginning with Peter and ending with Honorius II. Christ is represented by the small square which rests in the center of the drawing and consequently at the mid-point of the timeline. Thus the passage of time from the Creation to the present (and into the future to the eschaton) is marked on the keel of the ark.18 The twelve patriarchs and twelve apostles are singled out for special recognition; each group of twelve men is portrayed by a line of twelve small "icons," as Hugh calls them, extended across the width of the ark. Here the focus is clearly eschatological; Hugh describes their appearance as being "like the senate (senatus) of the city of God."19"
Também porque (não vá o diabo tecê-las?, já que a dita Professora tende para o plágio, sem a pinga de um sentido de honra que em geral respeitamos), aquilo que nós lemos e portanto deduzimos dos desenhos e dos registos (que incluem palavras) atribuídos a Hugo de S. Victor, integrantes do Libellus de formatione arche, e do Didascalicon - ou, resumidamente, naquilo a que tivemos acesso e podemos compreender -; para nós, e escrito por nós em português, a peça que é a Quilha da Arca de Noé, dá/dava estrutura, consistente, à Igreja**. Mas era/foi, enquanto alegoria, muito mais rica, do que aquilo que Grover Zinn (pelo menos no texto acima) dá a entender.
Por isso, pela nossa ideia que é «mais inclusiva», também devemos deixar aqui registadas várias perguntas:
1. Será a nossa fé, ou ainda um imenso entusiasmo que este tema suscita, que nos leva a fazer uma exegése bastante mais ampla?
2. A considerar que a Quilha desenhada por Hugo de S, Victor no seu Tratado, e os nomes que integra, pretendeu ser, também, muito ecuménica: i. e., definidora de uma Igreja mais universal, do que a ideia que temos da Fé e dos vários comportamentos a ela associados, que hoje a História ensina como tendo sido caracteristicos da Idade Média?
3. Quando Hugo de S. Victor associa a Igreja à Sabedoria (colocando a instituição Igreja primeiro, e os espaços de cada igreja-edifício, ou a assembleia local dos crentes, depois...), não está também a associar a dita Quilha - ou seja o elemento do barco, essencial (que tem que ser resistente para cortar a àgua) - a uma Sagesse? Ao Saber/Conhecimento que preconiza como a base, e a linha essencial por que se deve guiar uma instituição que pretende "levar a humanidade a Deus"?
As imagens a seguir (reproduções de um Tratado que se supunha ser apenas de Teologia, para contemplar o próprio manuscrito), como defendemos essas imagens tiveram propósitos arquitectónicos: ou seja, foram um desenho para obra (ideia nossa). Como Patrice Sicard estudou, e escreveu, foram repetidas dezenas ou centenas de vezes, constando nos arquivos de muitas catedrais. Mas, é sempre a mesma, partindo-se do geral - a página de um livro, para o particular, que se assinalou, a amarelo, para os leitores. A linha mais longa, longitudinal, seria a Quilha (visto que toda a Igreja era a Arca de Noé). No seu centro, de acordo com os desenhos - mas que nem sempre terá sido edificado assim (havendo transeptos) - , estaria o cruzeiro.
(legenda)
*"Tonteria" que alguns estudiosos, teólogos vaticanistas, como por exemplo M.-D. Chenu, Henri De Lubac, e outros, mostram ter sido um gosto especial, ou preferência, que a imensa fé dos Cristãos da Idade Média sentiam por analogias. Por metáforas e alegorias, que criavam umas sobre as outras, levando a que alguns destes teólogos cheguem mesmo a referir (parecer) haver uma certa infantilidade nas muitas analogias e associações que foram estabelecidas.Tantas, dizemos agora nós, que criaram uma imensa polissemia, que, particularmente, nos dificultou a vida, e a necessidade que tínhamos de organizar um Glossário Visual, que seria (depois), um ajudante precioso para se entenderem as obras de Arte (das Artes Visuais), e as ideias que as mesmas pretenderam sintetizar. Glossário que anda connosco, e que, talvez felizmente (?) ainda não se pôs no papel....
**Dava-lhe tempo, antiguidade (ancestral), associava-lhe as qualidades, os méritos, os valores, que até à data em que Hugo escreveu o Libellus - desde Adão, até ao Papa seu contemporâneo - todos esses grandes homens contribuíram para aquilo que a Igreja (a instituição) se tornou. Mais uma alegoria à estrutura, como Mary Carruthers explicou, tendo por base uma frase de S. Paulo.
NOTA: Tal como o leitor, gostaríamos de ter uma melhor paginação, a facilitar a leitura. Acontece que a nossa agenda, nem sempre permite chegar a tal desiderato. Façam como nós, não desistam do que um dia se pode vir a concretizar.
Mais importante para já, é mostrar aos que nos visitam o muito que existe e tem sido silenciado. Segundo o sapo statistics são muitas as visitas, até de outros continentes...