Muitos perguntam-se, e perguntaram-nos pessoalmente entre 2002 e 2005, onde fomos buscar certas ideias e informações.
Uma dessas noções de que pouco ou nada sabíamos antes (e tudo o que em cadeia daí saiu depois), encontrámo-la em António Filipe Pimentel, no seu estudo dedicado ao Palácio e Convento de Mafra, publicado pela Livros Horizonte.
É um trabalho fantástico, repleto de notas que muito nos influenciou. Leiam!
Mas hoje, em que muita água já nasceu, choveu, correu e chegou ao mar, também as nossas ideias se ampliaram, com apoio de outros autores. É o caso de M.-D. Chenu, que não lemos apenas em Patrick Démouy, mas em obras de Teologia. Informações que dá e mostram bem não só uma transversalidade dos saberes que são precisos percorrer (sem fronteiras), para se poder compreender o mundo em que estamos*, concretamente os seus valores patrimoniais e como as imagens que essas obras (culturais) integram, nasceram, não na natureza, mas na mente humana**.
Formas que alguns dirão serem abstractas, mas que nós preferimos chamar-lhes ideogramas, imagens de origem conceptual. Formas que segundo Chenu também serviram para "adensar simbolicamente" as obras em que foram incluídas:
Imagens que nem sempre foram simplesmente estampadas - como se fossem letras de textos - mas plasmadas (ou 'built in'): i. e., esculpidas e integradas, também a três dimensões, na arquitectura.
O que para acontecer - para transformar uma edificação num memorial, monumento histórico, ou numa exaltação da realeza e das suas prerrogativas - obrigou à manipulação dessas mesmas imagens de modo a que, simultaneamente, mantivessem as suas formas significantes (legíveis), e conseguissem, por exemplo, também fazer o suporte das edificações.
Mas ainda, e igualmente a dar outros contributos como: a definir os contornos dessas edificações, a dar forma(s) aos pavimentos que seriam pisados por pessoas de diferentes posições hierárquicas; a dar forma à luz que atravessava os vãos e se projectava em sombras (ou em luz), desenhando repetida e enfaticamente, os mesmos ideogramas, ou as ditas formas conceptuais, tradutoras de Deus. Etc., etc...
Só explicando e ajudando a compreender o passado de que somos herdeiros é que se conseguirá alcançar uma adequada interpretação do que está para trás: um passado que é cada vez mais difícil de entender para as mentalidades de hoje, por muito informadas que as mesmas se suponham. E, mesmo assim, será só em parte (talvez?) que se reconstituem o que foram/são lógicas antiquíssimas:
Como a Unção de David, que depois foi Rei dos Judeus, e durante séculos e séculos influenciou ritos, a liturgia e os seus «equipamentos materiais». Também o design dos espaços onde decorreram esses actos (litúrgicos), como era a Sagração de um Rei.
E claro que um Rei que era sagrado, ou ainda considerado santo - possivelmente de origem divina? -, também era o protagonista, por excelência, dos maiores feitos. Como o vencedor das batalhas que, numericamente, se previam perdidas. Assim acontecendo na batalha de Milvius (com Constantino), em Tolbiac (com Clóvis), em Ourique (com Afonso Henriques)...
*Ao qual viemos parar, como a água ao Oceano
**É sem qualquer dúvida uma das mais interessantes questões da Arte - a proveniência das formas: De onde vêm? São naturais ou artificiais? E sendo artificiais, como foram originadas? Será uma Kalocagatia?
***Associações que, não é raro ou impossível encontrar.